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“Consumir mais perto será o futuro”

02 Nov

A pandemia ajudou a perceber que a deslocalização das indústrias da Europa para a Ásia é um problema que terá que ser solucionado num futuro próximo. Garantir que os ecossistemas produtivos ficam na mesma área geográfica é um dos desafios que os vários intervenientes nas cadeias logísticas têm que resolver. Esta é uma das conclusões do debate “Resiliência da Cadeia Logística”, o Momento Expresso do 18º Congresso da Associação dos Transitários de Portugal (APAT), que decorreu esta tarde em Cascais

Aumento do custo dos transportes, falta de motoristas, metas ambientais e digitalização dos negócios são alguns dos desafios que se colocam ao setor logístico, que procura agora recuperar a sua atividade e volume de negócios para regressar aos níveis de 2019. A disrupção que estas temáticas provocam na atividade das empresas associadas da APAT são preocupações que justificam um debate aprofundado, ao longo dos dois dias do Congresso Anual da Associação dos Transitários de Portugal, que decorre entre hoje e amanhã, no Hotel Grande Real Villa Itália, em Cascais.
 
Sendo a resiliência uma das palavras-chave deste sector, foi também este o mote do painel que abriu o congresso. A conversa, moderada pela jornalista Marta Atalaya e integrada no ‘Momento Expresso, contou com a participação de Nuno Araújo, presidente do conselho de administração da APDL (Administração do Porto de Leixões), Luís Miguel Sousa, CEO do Grupo Sousa, José Manuel Cruz da AMT (Autoridade da Mobilidade e dos Transportes), e Rui Batista, diretor de produção da AutoEuropa. “O sector vive um cenário adverso desde o início de 2020 (e a China desde 2019), com quebras e dificuldades no fornecimento de componentes para a indústria automóvel”, recorda o responsável pela produção da AutoEuropa, para quem a incerteza gerada por esta situação “causa muitos transtornos, especialmente porque não sabemos quando acaba”.
 
Durante a pandemia, diz Rui Batista, a procura por semicondutores – essenciais na indústria automóvel – disparou noutras áreas, como os computadores ou os telemóveis, e a produção acabou por ser desviada para outras áreas. O responsável recorda que a cadeia logística destes produtos demora 26 semanas a ficar concluída, o que não permite estar dependente de encomendas feitas “em cima da hora”. Mas, apesar da dependência da indústria automóvel, as suas encomendas pesam apenas 10% no total do negócio, o que coloca outras indústrias como prioritárias na hora da entrega da produção.
 
O modo de transporte das mercadorias é outro desafio para o setor, onde o transporte rodoviário ainda é o dominante. No entanto, os convidados do painel são unânimes a considerar que é fundamental apostar em sistemas intermodais. Boas ligações entre o transporte marítimo, rodoviário e ferroviário será essencial para a sustentabilidade do setor, quer ao nível ambiental como económico. Contudo, e como alerta, José Manuel Cruz, falta investimento na ferrovia, o que exige uma estratégia de longo prazo. “E parcerias”, acrescenta Rui Batista que, exemplifica, “estamos a trabalhar em parceria com uma outra empresa privada e a fazer a transição da rodovia para a ferrovia”. Neste momento, diz, este meio representa praticamente 100% do transporte de automóveis da fábrica da AutoEuropa, em Palmela, para vários destinos da Europa. “Esta transição permite reduzir 80% na pegada carbónica do transporte”, garante o responsável.
 
Já Luís Miguel Sousa defende que o futuro da logística passa pela integração com o transporte marítimo, apesar do aumento dos preços e da falta de transportes disponíveis atualmente. “Há quatro anos os grandes armadores estavam a perder dinheiro, hoje estão ricos e a querer comprar tudo, até terminais”, recorda. Para os operadores mais pequenos resta apostar em parcerias e em focar os negócios naquilo que fazem realmente bem. A verdade, admite, “é que o mundo do futuro vai ser consumir mais perto”. Ou seja, é uma necessidade provocada pela exigência na sustentabilidade ambiental e dos negócios. “Haverá uma disrupção na forma como a produção estará organizada, garantindo que os ecossistemas se situarão na mesma área geográfica”, reforça.
 
No caso dos portos, a integração entre o transporte rodoviário e o marítimo já é uma realidade, mas, acredita Nuno Araújo, incluir a ferrovia é também uma necessidade. Um dos projetos que o Porto de Leixões tem como meta concretizar durante o próximo ano passa pela duplicação da capacidade de receber contentores. Mas, para consegui-lo, o responsável do porto admite que a ferrovia é um complemento muito importante. O porto seco da Guarda, um interface ferroviário com que o Porto de Leixões está a trabalhar, garante uma poupança de 15% para as empresas que ali deixem os seus contentores, em vez de armazená-los em Leixões, enquanto aguardam transporte ferroviário para destinos europeus.
 
“Se não tivermos um bom sector de logística, não conseguimos ter sucesso enquanto economia”, disse Pedro Nuno Santos, Ministro das Infraestruturas na abertura do congresso, deixando uma mensagem de esperança às empresas, e a garantia do apoio do Estado enquanto parceiro. Os trabalhos do 18º Congresso da APAT continuam este sábado com o tema “Emergência da Relação Logística e Tecnologia”, sendo a digitalização do sector outro dos desafios disruptivos, mas também fundamentais para que se mantenha funcional e competitivo.


Fonte: Fátima Ferrão | Semanário EXPRESSO
Fonte fotogrática: Semanário EXPRESSO

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